O tal do Luciano Huck salva as tardes preguiçosas e extensas dos sábados. Ele sabe prender a nossa atenção. Eu, que tantas vezes sou contra a política do assistencialismo em troca de voto e/ou audiência, verto lágrimas com a fórmula batida e cansada dos quadros Lar Doce Lar, Lata Velha etc. Luciano transforma homens e mulheres comuns em grandes personagens. E o Brasil todo se comove facilmente, até mesmo quando não há mérito para tal.
Porém, neste sábado, 18 de junho, o contador de histórias se superou: apresentou ao Brasil uma mãe que cria duas filhas em São Paulo com R$ 300,00 por mês. A grande surpresa foi a dignidade com que aquelas meninas foram criadas. Huck, embasbacado com a delicadeza dos gestos, com a grandiosidade dos hábitos e o vocabulário delas, perguntou o que não deveria: “E o que é miséria para você?” Com um sorriso sincero no rosto, a mãe respondeu que miséria era falta de saúde para trabalhar. “Sou pobre, não miserável!”. E, sutilmente, provou o que disse.
A verdade é que, enquanto acompanhamos a luta de pais de classe média e classe média alta, com filhos cada vez menos interessados nos estudos, as duas filhas daquela senhora dão um show na escola e ainda fazem cursos almejando aumentar a renda familiar, como o de confeitaria. Enquanto presenciamos casos de adolescentes abastados envolvidos com álcool e drogas, elas fazem curso de música clássica com um violino emprestado, cantam e sabem inglês. E, ainda falando do lado material da coisa, enquanto queremos sempre ter os melhores aparelhos celulares, notebooks, ipads, etc, aquelas duas meninas nunca tiveram o prazer de comprar uma blusa sequer, vivendo de doações. Mas, elas têm uma pequena biblioteca em casa.
Devo ainda lembrar que, enquanto vemos famílias sendo destruídas por falta de respeito e amor ao próximo, o Brasil conheceu a intimidade de três pessoas que residiam em dois cômodos, sem privacidade alguma, e que dividiam um único colchão. Porém, elas tinham metas espalhadas pela casa que diziam assim: “ser mais calma e tranquila”, “ser pontual”, “ser ação e fazer doação”, dentre outras. Em pleno sábado à tarde, um tapa na minha cara e na cara de metade da população brasileira. Miseráveis, elas, Luciano?! Não mesmo!
Manuela Berbert é jornalista e colunista da Revista Contudo.
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